terça-feira, 15 de março de 2011

Afinal, o mal existe?


Hoje minha mãe me disse que o Diabo existe, mas ele quer que pensemos o contrário.

Disse a ela que não. Não existe uma força oposta a Deus. Nada se opõe ao Criador.

Ela me disse que o padre falou disso hoje na missa. Que esse é um dos maiores enganos da humanidade. O mal existe, ela repetiu.

E eu voltei a dizer: o mal existe, mas não existe uma entidade que personifica o mal como a Igreja quer nos fazer acreditar. Pode até existir pessoas que acreditam nisso, espíritos que acreditam nisso, mas nada se opõe a Deus.

O teu pai pensa do mesmo jeito, ela disse. Mas ele existe.

Não mãe, eu disse, isso é blasfêmia. Nada se contrapõe ao Criador.

Nossa conversa foi interrompida com a chegada de meu pai. Na saída me despedi dela com abraço apertado e caminhei pelo sol quente até o ponto do ônibus. Fui para o cinema assistir ‘O Ritual’. O filme tratava exatamente desse assunto...

Um menino que nasceu e se criou numa funerária, preparando cadáveres para o enterro resolve fugir desse destino abraçando o sacerdócio. Antes da ordenação ele resolve abandonar a igreja, mas acaba sendo persuadido a fazer um curso para aprender sobre exorcismo em Roma. Se depois disso ele ainda quiser sair, será liberado.

Premissa aparentemente absurda.

Seria mais provável que alguém com crise de fé, e que usou a igreja como um refúgio de uma dura realidade, ao ser confrontado justamente com uma prática medieval, queira fugir mais ainda da Igreja. Para o clérigo que o manda para Roma essa é a oportunidade de ele, de uma vez por todas, sanar suas dúvidas a cerca de Deus e sua vocação.

Sentei na cadeira e embarquei na viagem a espera de ver a bela Alice Braga na tela. Mas Alice não foi páreo nem para o papel, nem para a discussão travada no filme, que para mim tinha um sentido mais profundo ainda.

Devo confessar que durante muito tempo me questionei sobre isso e fiquei esperando para ouvir o que o personagem e o diretor tinham a me dizer. Infelizmente, eles seguiram a velha cartilha do terror aprendida com ‘O Exorcista’: um homem cético, com crise de fé, ajuda um outro padre, mas velho e cansado, a exortar o dito cujo do corpo de uma adolescente.

A conclusão do ritual é a mesma conclusão do vaticano: se existe Deus, existe o mal, existe o Diabo.

Ouso dizer, o vaticano está errado, ou então está omitindo uma boa parte da verdade. Ainda acredita que é melhor manter seus fieis sob o cabresto de dogmas muito ultrapassados. É melhor incutir o medo a perder os fiéis. É melhor simplificara verdade, porque é muito mais complicado contar como tudo é realmente. Devem pensar...

Entendo que Deus está muito acima do bem e do mal. Tão acima que só podemos vislumbrar uma pálida luz de sua presença quando o olhamos sobre o prisma dessas duas forças. O bem e o mal são pólos que se completam e que tem a razão de existir um no outro, como todo pólo. O que seria do bem se não houvesse o mal para defini-lo. O que seria do mal se não houvesse o bem para demarcá-lo. O que me entristece é saber que a grande maioria das pessoas fica presa no emaranhado dessas duas qualidades e esquece o Criador e, infelizmente, a Igreja incentiva isso, principalmente nesses tempos de Ratzinger.

Quando era criança passei muito tempo me perguntando se eu era bom ou mal, se eu acreditava em Deus, ou no Diabo, se eu merecia o céu ou o inferno. Perdi muito tempo nesses conceitos que só me acorrentaram e trouxeram infelicidade a minha vida. Hoje entendo que esses conceitos servem apenas para nos manipular e diminuir.

Nós somos criados de luz e sombra, assim temos dentro de nós o que chamamos de bem e de mal, mas vivemos e vamos aprendendo a fazer escolhas para nós. É a qualidade de nossas escolhas, ou as intenções com as quais nós as fazemos, que vão acabar nos definindo. Ou melhor dizendo, definindo nosso destino. Definitivamente tem mais coisa entre o céu e a terra do que nossa vã filosofia pode alcançar...