terça-feira, 19 de julho de 2011

Sobre homens, heróis e deuses

No filme X-Men - Primeira Classe (X-Men: First Class/2011), viajamos no tempo e descobrimos o início de tudo... Nesse princípio, a câmera mostra Erik Lehnsher (enquanto criança Bill Milner e quando adulto Michael Fassbender), que será Magneto no futuro. O menino é um judeu franzino, que foi separado dos pais num campo de concentração polonês e alvo das vilanias do comandante Sebastian Shaw (Kevin Bacon). Na primeira cena em que o poder de Erik é revelado – ele consegue atrair e mover os metais – quase meia dúzia de soldados nazistas são arrastados pelo menino que não quer se separar dos pais. Tudo sob os olhares de Shaw que a partir daí resolve se utilizar do garoto, não sem antes fazê-lo viver uma cena profundamente cruel e que lhe marcará para o resto da vida. Uma vida que será pautada pelo desejo de vingança, pelo ódio e raiva.

Outros dois personagens centrais surgem numa realidade completamente oposta. Numa casa tão rica, que chega a ser opulenta, encontramos o menino Charles Xavier (interpretado quando criança por Lawrence Belcher e na fase adulta por James McAvoy). Xavier acorda no meio da noite e sai empunhando um taco de beisebol enquanto desce as escadas de sua mansão castelo em direção a cozinha. Lá, encontra o que parece ser sua mãe. O menino tem a capacidade de ouvir pensamentos, lembranças e induzir pessoas. Assim, Xavier vê a mulher e sabe que não é a sua mãe. Antes de ser a descoberta do pavor, essa é a chance de ver que existe um outro ser igual a ele. Aí se revela Mística (interpretada quando criança por Morgan Lily e quando adulta por Jennifer Lawrence), uma menina de pele azul e com a capacidade de se metamorfosear em quem quiser. Nossos personagens crescem nesses universos opostos.

Termina a segunda guerra mundial e o mundo parece que entra imediatamente na Guerra Fria. Enquanto isso, Erik surge adulto, mas ainda acorrentado as lembranças de criança. O personagem começa a empreender uma viagem em busca de Sebastian Shaw. Quer realizar sua vingança. Na outra ponta da história, Xavier estuda a evolução genética e se forma com louvor. E Mística, agora apresentada como sua irmã, convenientemente na pele de uma adolescente comum, começa a se questionar como conseguirá se relacionar com alguém, sendo tão diferente. Como poderá ser aceita por um homem?...

As duas pontas dessa história vão ser ligadas pelo vilão Shaw. Os plano do ex-nazista irão unir Erik e Xavier. Eles se tornarão amigos, partilhando um laço profundo. Será essa amizade irá mudar toda a história dos X-Men, na verdade, construí-la de fato.

As diferenças dos dois parece que ajuda a solidificar ainda mais a união. Um pacífico (Xavier) e outro essencialmente destrutivo (Erik). É inevitável ver na relação dos dois algo afetivo, quase uma dependência. Há uma menção homoafetiva no final, quando Erik, resgata uma mutante que tem os mesmos poderes de Xavier dizendo: ‘meu amigo deixou um vazio que eu gostaria que você preenchesse’.

Mas o filme vai além disso... O longa trata da descoberta dar dor, antes de qualquer coisa. A dor vivida por homens e mulheres que não podem ser quem são, que escondem sua verdadeira natureza. E que muitas vezes nem as conhece. Mostra esses seres vivendo paradóxicos éticos. Sob a capa do super poder, há naverdade um profundo desejo de ser aceito e ainda vivem seus dilemas. Eles se perguntam se devem ou não ser como são. Usar ou não usar poderes sobre humanos em meio a uma sociedade belicista e altamente egoísta, que não pensa duas vezes em se ver livre do obstáculo, da ameaça. Ainda que essa ameaça tenha sido criada por ela mesma – vide Osama Bin Laden, Afeganistão, Irã, etc.

Só fazendo um adendo...Imagine pessoas que descobrem em si, lá dentro, uma realidade insuspeita pela maioria das pessoas. Percebam que expressar essa realidade seria expor o que muitos poderiam considerar uma espécie de desvirtuação do passo natural da natureza... Essa é uma das idéias que vêm sendo amadurecida na série X-Men, acrescendo, a cada episódio, um ingrediente a mais. A metáfora da descoberta da sexualidade, ou homossexualidade, é uma das mais comuns feitas à série. Mas há também a da perseguição dos judeus, dos negros, mulheres, comunistas, todos aqueles que precisaram em algum momento da história esconder o que pensavam ou quem eram para serem aceitos.

Neste filme, um ingrediente impossível de deixar escapar é como o vilão de toda a série, Magneto, surge como um grande protagonista. Como não entendê-lo? E aí é preciso destacar o trabalho de Michael Fassbender (Magneto), que constrói um personagem corroído, tenso, sensível e apaixonante. Que leva ao espectador a se questionar se ele não tem razão em seu desejo de destruir.

James McAvoy também consegue imprimir ao Professor Xavier muito mais realidade do que foi mostrado até agora. Com sua inteligência e capacidade de perscrutar a alma humana, Xavier mostra a benevolência, mas também a solidão. Contudo, talvez a grande surpresa seja mesmo Kevin Bacon, o seu vilão (Sebastian Shaw) é surpreendente e mostra que o ator conseguiu, enfim, ir além do jovem galã dos anos 80 de Footloose. Como últimas notas dignas de menção, estão Jennifer Lawrence que constrói uma Mística frágil, mas já com rápidos lances da ferocidade que lhe será típica no futuro. E Nicholas Caradoc Hoult, que constrói o Fera a partir de sua auto-rejeição. Nicholas já havia impressionado em Um Grande Garoto e Direito de Amar.


Talvez o mais surpreendente no filme seja que não há uma luta do bem contra o mal, mas uma luta entre deuses e homens. Os primeiros em permitir ou não a existência dos homens. Xavier aí seria Prometeu, o Titã que rouba o fogo do Céu para que a humanidade possa evolui, enquanto Magneto seria Zeus que em sua fúria nos dá o dilúvio. Enquanto isso os pobres mortais lutam entre si, se digladiam e se destroem.

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