
Essa matéria saiu em parte na Revista NORDESTE de outubro.
Fiz uma entrevista com alguns analistas políticos para traçar como seria a política e a economia brasileira no governo de Dilma Rousseff (PT). A conclusão é unânime: a tendência indica uma guinada à esquerda. Pelo menos no que tange a política externa e a uma inserção maior do Estado na economia. Durante a campanha, a petista garantiu que irá acabar com a miséria, investir pesado em educação – priorizando escolas técnicas em cidades de até 50 mil habitantes – saúde – construir 500 Upas (Unidades de Pronto Atendimento 24 horas) – segurança – com ênfase no combate ao crack, polícias pacificadoras, vigilância nas fronteiras e reforço na Polícia Federal. O programa de Dilma Rousseff aponta para uma continuidade do governo Lula com apenas pequenas alterações no seu curso. Dilma, que será a primeira mulher a ser presidente do Brasil e tem sido apontada por jornais da Alemanha, EUA e Inglaterra, como a mulher mais poderosa do mundo dá sinais que irá manter inalterados os três pilares em que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) baseia sua política econômica: metas de inflação; câmbio livre e redução gradual do déficit público. Uma política do continuísmo, pragmática, ainda baseada no controle da inflação através de elevadas taxas de juros.
O cientista político da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Zaidan Filho, faz uma crítica à manutenção dessa política por Rousseff. Para ele a candidata continuará a favorecer aos banqueiros, por conta da dívida pública, e os mais pobres, sacrificando mais uma vez a classe média com uma pesada carga tributária. “Em termos econômicos a política terá continuidade com alta taxa de juros, aumento da cobertura da Bolsa Família e ajustes fiscais. Um governo de Dilma irá preparar algum tipo de ajuste fiscal e quem vai sofrer mais serão os servidores públicos e trabalhadores que têm uma maior renda. Não sei se os aposentados também...”, vaticina.
O cientista paraibano, Jaldes Menezes, faz um adendo. “O Estado tem o poder muito forte no Brasil e é inevitável que esse governo Dilma tenha alianças com vários setores da indústria e do capital brasileiro. Haverá uma consorcio entre os grupos e o estado. É bom lembrar que Eike Batista, hoje um dos homens mais ricos do Brasil, que se aproveitou desse boom econômico e dos vultosos investimentos do estado, é filho de Eliezer Batista (coube a Batista transformar a mineradora Vale do Rio Doce em uma das maiores companhias do planeta, presidindo-a de 1961 a 1986). O empresariado está rachado, inclusive os grandes grupos econômicos, uma parte expressiva tende apoiar o governo. A indústria naval está com o governo, setores da indústria têxtil, calçados. A base empresarial não bloca mais com o PSDB e o DEM”, argumenta, dando outra visão à política mais a esquerda de Dilma seguindo a linha neo neo keynesiana.
Apesar de considerar que um governo Dilma será mais difícil para a classe média, Zaidan argumenta que a política externa implementada por Lula, e que deve ser continuada por Dilma, é boa. “Ela é pró-ativa, multilateral, pacifista e prioriza uma relação com os países do eixo sul-sul”, diz. Sobre o que seria acabar com a miséria, o cientista lembra que Lula criou uma nova classe média, com aumento de salários acima da inflação e com a distribuição do Bolsa Família, elevando a renda de milhões de pessoas que saíram da pobreza e entraram na classe C e D dando mais acesso ao consumo. “É um pouco de uma política de Keynes”, explica. Zaidan Filho se refere a John Maynard Keynes que defendeu uma política econômica de Estado intervencionista, através da qual os governos usariam medidas fiscais e monetárias para mitigar os efeitos adversos dos ciclos econômicos - recessão, depressão e booms. Suas idéias serviram de base para a escola de pensamento conhecida como economia keynesiana. Assim, para Zaidan, a política de Dilma baseia-se em Keynes ao usar o fundo público para estimular a demanda e aquecer a economia.
Outro cientista político, Jaldes Menezes, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), também aponta para um projeto de continuidade. “Rigorosamente não existe um projeto autônomo”, frisa. Analisando o governo Lula, Menezes, afirma que o petista muda a partir de 2006, durante o segundo governo. O ponto central teria sido a crise do mensalão. “Dilma foi um fator importante na Casa Civil, a partir da sua chegada, no governo Lula II tivemos um desenvolvimento econômico razoável. De 2006 a 2009 o Brasil foi alçado a um país emergente. Houve uma redução da dívida externa e aumento relativo da divida interna. Nos últimos anos tivemos a participação ativa do governo em vários esquemas de reorganização empresarial como a compra da Sadia pela Perdigão, a Oi versus a Telefônica, a capitalização da Petrobras para o investimento do pré-sal, além de uma perspectiva de mais R$ 30 bilhões que devem ser investidos pelo BNDES – desde 2009 já foram repassados pelo Tesouro Nacional R$ 180 bilhões ao banco”, recapitula o paraibano.
Contudo, apesar dos bons resultados, o governo Lula abandonou completamente a reforma política, aponta Zaidan Filho. “Uma reforma política poderia dotar o país de uma engenharia institucional que melhorasse a eficácia de relação entre os poderes e os partidos, tornando essa relação menos clientelista e menos fisiológica”, defende. O presidente Lula já reclamou mais de uma vez da dificuldade de conseguir que o Congresso votasse as reformas propostas pelo Executivo, segundo o cientista político pernambucano, o difícil equilíbrio de forças entre aliados e oposição nas duas casas (Senado e Câmara dos Deputados) prejudicava ainda mais o andamento dos trabalhos. Ao menos nesse quesito um governo de Dilma Rousseff não deve ter problemas e poderá investir em reformas políticas, fiscais e previdenciárias emperradas no Congresso, já que o governo petista terá a maioria necessária para aprová-las, algo nunca visto antes no Brasil. E, definitivamente, um passo para longe de escândalos como mensalões, dossiês e tráfico de influência. Apesar de um provável lua de mel com a bancada situacionista, Jaldes Menezes aponta um fator complicador: “O PT, certamente, concorre a primeira ou segunda bancada da câmara de deputados. Haverá uma certa folga. Embora teremos também a escolha do presidente do Senado e da Câmara. Nessas escolhas sempre surge um certo conflito. Ainda não estão claros entre PT e PMDB quem será o presidente das duas casas. Além disso, há uma diferença, Dilma não tem o mesmo prestigio de Lula. Dilma terá que operar agora sem a sombra de Lula. Vale a lembrança que Lula foi iniciador de seu próprio projeto entre setores econômicos, internacionais e políticos”, argumenta.
Para corroborar a tese de um governo mais à esquerda, Zaidan ainda lista as pessoas que estiveram em volta da ex-ministra da Casa Civil durante a campanha. O cientista político aponta os nomes do vice-presidente do PT, o paulista Rui Falcão, do presidente do paritdo, José Eduardo Dutra, do ‘camarada’ José Dirceu e do assessor especial da Presidência da República para assuntos internacionais Marco Aurélio Garcia. Além deste, também é citado o ex-guerilheiro e ex-prefeito de Minas Gerais, o economista Fernando Pimentel (PT-MG).

Além disso, há um outro dado que irá diferir o possível governo de Dilma do atual governo de Lula: a candidata não é uma personalidade acima do PT, como é o Lula. “Vai ser um governo de partido”, argumenta Zaidan. “A presidenta, provavelmente, vai ser mais afinada com as lideranças. Não se sabe como será o estilo de Dilma governar com os partidos, o Congresso, nem a autonomia que terá para governar. Ela tem um estilo mais burocrático, não é uma pessoa de trânsito fácil com o Congresso e os partidos. É um pouco durona, não tem jogo de cintura, como Lula. Lula tem um imenso jogo de cintura. Por isso acho que o partido tem grandes chances de hegemonizar esse governo. Há um perigo dela se tornar das duas umas: ou refém do PMDB ou do PT”, avalia. Segundo os cientistas, Dilma precisaria ter uma vitória acachapante para conseguir um bom respaldo popular e não precisar recorrer a Lula ou aos movimentos sociais. “Lula pode ajudar, mas não seria bom. Se Lula estiver muito presente ela seria um títere, um fantoche, ficaria péssimo para ele, para ela e para o PT. O que Lula tem a fazer é desenvolver uma carreira internacional. Pode ser um conselheiro, mas não uma eminência parda”, diz Zaidan.
Cenário internacional

No cenário internacional a tendência é que o Brasil siga sob a batuta de Marco Aurélio Garcia, estimulando boas relações e até mais aproximação com os governos de esquerda – Hugo Chavéz (Venezuela), Fernando Lugo (Paraguai), José Mujica (Uruguai), Rafael Correa (Equador), Evo Morales (Bolívia) e claro, Cristina Kirchner (Argentina). O Brasil deve manter e consolidar sua liderança política na região, já que a econômica é incontestável. Conflitos com os EUA, pela defesa da independência da América Latina e divergências de opinião em relação a política norte-americana referente aos Palestinos, Israel e ao Irã, serão inevitáveis.
O Nordeste
O Nordeste continua crescendo, principalmente Bahia, Ceará e Pernambuco. No governo Lula, Pernambuco ganhou um caráter econômico estratégico. Mas que na Bahia, apesar do ocaso do carlismo. A região Nordeste recebeu grandes investimentos do governo Lula, como a refinaria de petróleo Abreu e Lima de Suape, o pólo petroquímico e a Hemobrás, em Pernambuco; o projeto de siderúrgica e a refinaria no Ceará; Na Bahia, a ampliação e modernização da Refinaria Landulpho Alves, do estaleiro e da ferrovia ligando Ilhéus a Tocantins. Além da recuperação e duplicação da BR-101, a Transposição do Rio São Francisco e a construção da ferrovia Transnordestina. Obras que atingem toda a região. Só no período de 2007 a 2010, foram direcionados para a região nada menos que R$ 160 bilhões em infraestrutura social-urbana, energética e logística (sistemas, vias e terminais de transportes).

Nenhum comentário:
Postar um comentário