quinta-feira, 13 de maio de 2010

Marina Silva: uma evangélica light e a nação carbono

Como prometi, completado a série de perfis sobre os presidenciáveis, aí vai um pouco sobre Marina Silva


Durante um simpósio sobre criacionismo – aquela história de dizer que tudo aconteceu tal qual a Bíblia descreve -, Marina Silva foi entrevistada por um jornalista evangélico sobre o assunto. O rapaz perguntou o que ela achava do ensino do criacionismo em escolas confessionais que também ensinavam o evolucionismo. "A ciência se faz pela multiplicidade de olhares. Mesmo que você tenha uma visão criacionista, se você coloca claramente para as pessoas que há outra visão, a do evolucionismo, para que as pessoas tenham liberdade de escolha, não vejo demérito." E continuou: "O errado é se não formos capazes de ter uma educação plural, que seja capaz de mostrar os diferentes pontos de vista, para que as pessoas possam fazer suas escolhas”, disse.

Bastaram essas palavras para todos dizerem que a candidata é a favor do ensino do Criacionismo nas escolas. Questionada por que ela não diz logo que é contra o ensino obrigatório do criacionismo, Marina saiu-se: "O ensino religioso é optativo, e está previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação. É preciso treinar professores para ensinar o que é o budismo, o cristianismo, todas as crenças. É isso o que eu quero dizer", afirmou.

Aos 52 anos, Marina Silva (nascida Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima) tem uma trajetória de vida impressionante. Talvez até mais impressionante que a de Lula (outro Silva famoso).

A história de Marina começa com seu pai (o cearense Pedro Augustinho da Silva) que aos 19 anos, desembarcou no Acre com a promessa de melhorar de vida. Estabelecido no seringal Bagaço, a 70 quilômetros de Rio Branco, passou a trabalhar 16 horas por dia. Tirava três latas de leite de látex diariamente. Do que ganhava, tinha que dar metade ao dono do seringal e outros 20% ao gerente. Oito anos depois, mandou buscar a mãe e a noiva, Maria Augusta. Casaram-se e tiveram onze filhos; oito deles sobreviveram - sete mulheres e um homem.

Quando era criança Marina e as irmãs acordavam cedo e caminhavam 7 quilômetros com o pai até o seringal. Trabalhavam quase todos os dias. Marina sempre teve a saúde frágil - Aos 6 anos teve o sangue contaminado por mercúrio, o que quase lhe tiraria a vida quando adulta. Talvez parte dessa história de fragilidade na saúde tenha começado quando a rodovia BR-364 foi construída e trouxe à região a malária e o sarampo. Primeiro tios, primos e a avó de Marina morreram. Contudo, dentre os filhos, foi ela a que mais adoeceu. Até os 15 anos teve cinco malárias, uma leishmaniose e uma hepatite (já teve mais duas hepatites, depois dessa idade).

Perdeu a mãe aos 15 anos e como a irmã mais velha já estava casada, Marina passou a tomar conta da família. Foi nesta época também que a primeira hepatite a levou a ser internada na capital. Não voltou mais para casa. Depois do tratamento foi morar no convento das Servas de Maria. No convento, lhe assaltavam lembraças da avó, que lhe contava histórias da Bíblia. Marina sonhava em ser freira. Na capital resolveu estudar e matriculou-se no Mobral para aprender a ler. Até então, ela sabia apenas ler as horas no relógio e fazer operações básicas de matemática, que havia aprendido com o pai.

Foi trabalhar como empregada doméstica durante um tempo, mas a saúde frágil a incomodava. Com a ajuda do bispo de Rio Branco na época, dom Moacyr Grechi, conseguiu hospedagem e tratamento médico em São Paulo. As passagens foram providenciadas pela família, que vendeu dois animais. Quando retornou, casou-se e foi morar num barraco na periferia. A essa altura, havia concluído o supletivo de 1º e 2º graus e, logo depois, foi aprovada no vestibular de história da Universidade Federal do Acre. "Na casa dela as paredes eram de lona preta", lembra o governador do Acre, Binho Marques, amigo de Marina Silva desde o movimento estudantil. "Você não tem noção do que era. O chão tinha tábuas soltas. Um cômodo com uma cama de casal e nada mais", disse.

Na faculdade, Marina começa a aproximar-se da política filiando-se ao Partido Revolucionário Comunista, organização clandestina na qual militaram José Genoíno e Tarso Genro, e conhece Chico Mendes. Ela já dava aulas de história e passou a frequentar as reuniões do movimento sindical. Seus filhos mais velhos - Shalon e Danilo, que é publicitário em Brasília - já haviam nascido. O grupo, que incluía o futuro governador do Acre Jorge Viana, decidiu que deveriam se filiar ao Partido dos Trabalhadores para ajudar Chico Mendes a ser eleito deputado estadual.

Marina entra na política definitivamente em 1988, quando foi a vereadora mais votada de Rio Branco. Em 1990, foi eleita deputada estadual e liderou um movimento para acabar com a aposentadoria de ex-governadores. Chegou ao Senado em 1994, aos 36 anos. Era a mais jovem senadora eleita. No final do primeiro ano de mandato, ela passou mal depois de uma viagem. Foi internada às pressas e desenganada, devido à contaminação por mercúrio.

Foi a luta contra a doença que a levou a conversão à religião evangélica em 2004. Marina é da Assembleia de Deus Madureira. A escolha surpreendeu até seus amigos mais próximos. O governador Binho Marques defende: "Conheci a Marina católica, meio comunista, afastada da religião, e protestante, mas ela sempre foi a mesma pessoa", afirmou. "Acho que Marina procura achar uma representação externa, para definir o que ela é. Hoje ela acha que isso é ser evangélica, mas esses rótulos nada influenciam o que ela foi e é realmente", concluiu.

Por conta da contaminação com mercúrio Marina deve se manter distante de frutos do mar, condimentos, lactose, carne vermelha, álcool, bebidas gasosas, qualquer cosmético, perfume, tinta de impressora, carpete, poeira. O contato com qualquer um deles lhe causa imediata coceira, falta de ar e, às vezes, taquicardia. O regime lhe dá um ar as vezes cansado e um peso que não passa dos 53 quilos.

Marina é naturalmente elegante, e quase sempre usa vestidos longos, arrematados por um xale. Tem quase cinquenta deles. O cabelo anelado é amarrado normalmente em um coque, circundado por uma fina trança. No dedo anular esquerdo, usa uma aliança dourada, com a inscrição "Jesus", e carrega uma bolsa preta quadrada, na qual não há espaço para quase nada além de uma grande Bíblia de capa de couro preta, toda grifada a lápis.

Sobre os temas ambientais Marina menciona que o aquecimento global é uma bomba a ser desmontada nos próximos cinquenta anos; que o Brasil tem a matriz energética mais limpa do mundo e por isso deveria dar exemplo; que pesquisas mostram que os brasileiros preferem pagar mais caro por alguns produtos, em troca de preservar a Amazônia.

Contudo, entre os ambientalistas, há divisões a respeito da ex-ministra. "Está provado que energia nuclear é limpa e segura", disse o consultor ambiental Fábio Olmos. "Transgênicos, pesquisa com célula-tronco, isso você testa, vê o impacto e autoriza ou veta. Ela é do time dos que não querem nem testar."

Marina Silva reelegeu-se senadora em 2002, com votação quase três vezes superior à anterior. Em 2003, com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva para a Presidência da República, foi nomeada ministra do Meio Ambiente. Desde então, enfrentou conflitos constantes com outros ministros do governo, quando os interesses econômicos se contrapunham aos objetivos de preservação ambiental. Marina afirmou que desde a reeleição do presidente Lula, no fim de 2006, alguns projetos importantes de sua gestão, como a criação de áreas protegidas na floresta amazônica, haviam sido praticamente paralisados.

Vale ressaltar que sob sua gestão, durante o primeiro governo Lula (2003-2006), foram delimitados 24 milhões de hectares verdes , contra apenas 300 mil hectares em 2007. Em dezembro de 2006, enfraquecida por uma disputa com a ministra chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que a acusava de atrasar licenças ambientais para a realização de obras de infra-estrutura, a ministra avisou que não estaria disposta a flexibilizar a gestão da pasta para permanecer no governo.

Marina Silva também denunciou pressões dos governadores de Mato Grosso, Blairo Maggi, e de Rondônia, Ivo Cassol, para rever as medidas de combate ao desmatamento na Amazônia. Em 13 de maio de 2008, cinco dias após o lançamento do Plano Amazônia Sustentável (PAS), cuja administração foi atribuída a Mangabeira Unger, Marina Silva entregou a carta de demissão. A razão: falta de sustentação à política ambiental. Em 2009, anunciou a sua desfiliação do PT e filiou-se ao Partido Verde.

Vale dizer ainda que o partido Verde em muitos estados apoia Serra e na Câmara Federal tem Zequinha Sarney como líder, o que reflete uma salada de incongruências para o partido. Também é tido como um partido de uma elite com pendores ecológicos, mas não necessariamente com consciência política. No momento, o partido tenta um apoio do PSOL que insiste na defesa do MST. Parte do PV não vê com bons olhos, o Movimento dos Sem Terra.

O título do artigo (nação carbono) diz respeito a idéia onde nações menos desenvolvidas, mas com muitos recursos ecológicos venderiam suas cotas de carbonos aos países mais desenvolvidos que agridem a natureza.

Marina hoje vive com a agenda lotada, com entrevistas aos jornais estrangeiros e do Brasil que a assediam a todo instante. Visitas de correligionários evangélicos são constantes e almoços, jantares e eventos onde a nata endinheirada de São Paulo e do Rio de Janeiro também entulham sua agenda. Gente da alta sociedade que talvez não entenda realmente a dimensão da trajetória da candidata, mas (em alguns casos) querem realmente fazer algo pela ecologia. Em outros casos, muitas dessas pessoas que andam em torno da pré-candidata, são apenas arroz de festa.

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